top of page
Buscar
  • Foto do escritorAntonio Vinicius Silva

O que é a teoria do adimplemento substancial na relação do consumo?

  • De que se trata?


Da teoria do Adimplemento substancial, cuja formulação repele a resolução do negócio se o adimplemento foi realizado de modo substancial, ou seja, se a parte inadimplida é mínima me relação ao todo. Se, digamos, o consumidor pagou dezenove – de um total de vinte prestações-, não seria razoável que a contraparte pretendesse extinguir o negócio em razão do inadimplemento da última. Mais conforme a boa-fé objetiva é cobrar, pelas vias ordinárias, a parcela inadimplida, ao invés de pretender ter de volta o bem alienado, ou recusar a prestar o serviço contratado.

A jurisprudência tem aceitado a referida teoria: Seguro. Inadimplemento da segurada. A companhia seguradora não pode dar por extinto o seguro, por falta de pagamento da última prestação do prêmio, por três razões: a) sempre recebeu as prestações em atraso, o que estava, aliás previsto no contrato, sendo inadmissível que apenas rejeite a prestação quando ocorra o sinistro; b)a segurada cumpriu substancialmente com a sua obrigação, não sendo a sua falta suficiente para extinguir o contrato; c) a resolução do contrato deve ser requerida em juízo quando será possível avaliar a importância do inadimplemento, suficiente para a extinção do negócio” (STJ, REsp. 76.362, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, j. 11/12/95).


Posteriormente, em outras ocasiões, a jurisprudência teve oportunidade de reafirmar a consagração da teoria. Em caso de contrato de arredamento mercantil (leasing) para aquisição de veículo, tendo sido pagas quase todas as parcelas devidas, julgou-se – com base na teoria do adimplemento substancial, permeada pela boa – fé objetiva e pela função social do contrato- que não cabia, no caso, ação de reintegração de posse, o que se mostraria desproporcional diante do débito remanescente. O STJ frisou, nessa linha, que “a teoria do substancial adimplemento visa impedir o uso desequilibrado do direito de resolução por parte do credor, preterindo desfazimentos desnecessários em prol da preservação da avença, com vistas à realização dos princípios da boa-fé e da função social do contrato”. (STJ, REsp. 1.051.270, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, 4ª T., DJ 05/09/11).


Observa-se que a dívida não paga permanece podendo ser cobrada – teríamos, do contrário, amplo campo para fraudes. Apenas se diz que o caminho cômodo usado pelas instituições financeiras, de tomar o bem de volta compulsoriamente, não se mostra adequada diante do montante que foi pago da dívida. Melhor é que o credor cobre, com meios menos gravosos e mais proporcionais. O STJ, mais tarde, reafirmou a adoção da teoria do adimplemento substancial, em ação que buscava a reintegração de posse de 135 carretas, objeto de contrato de leasing, após o pagamento de 30 das 36 parcelas ajustadas (STJ, REsp. 1.200.105, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª T., DJ 27/06/12).


Tem sido igualmente afirmado, nas vias jurisprudenciais, que é possível ao devedor discutir a ilegalidade das cláusulas contratuais na própria ação de busca e apreensão em que a financeira pretende retomar o bem adquirido. É o entendimento do STJ, por sua Segunda Seção (STJ, REsp. 267.758, j. 04/05/05). A Ministra Nancy Andrighi, em voto – vista, ponderou que seria pouco razoável reconhecer determinada nulidade num contrato garantindo por alienação fiduciária e não declará-la apenas por considerar a busca e apreensão uma ação de natureza sumária.


Porém, posteriormente, em 2017, o STJ passou a entender – em posição que acreditamos equivocada – que a teoria do adimplemento substancial não se aplica aos contratos de alienação fiduciária (em clara modificação do atendimento anterior, que assim aceitava). Os argumentos para justificar a mudança de entendimento foram pouco consistentes, em nossa opinião. Traduzem interpretação de espantoso literalismo. São eles: a) o Decreto –Lei nº 911/1969 não traz qualquer restrição à busca e apreensão do bem; b) seria incongruente inviabilizar a busca e apreensão do bem, “quando a lei especial de regência expressamente condiciona a possibilidade de o bem ficar com o devedor fiduciário ao pagamento da integralidade da divida pendente” (STJ, REsp. 1.622.555, Rel. p/ acórdão Marco Bellizze, Segunda Seção, DJ 16/03/2017). No mesmo julgado o STJ destacou que “a propriedade fiduciária, concebida pelo legislador justamente para conferir segurança jurídica às concessões de crédito, essencial ao desenvolvimento da economia nacional, resta comprometida pela aplicação deturpada da teoria do adimplemento substancial”.


O julgado frisou ainda que “a aplicação da teoria do adimplemento substancial, para obstar a utilização da ação de busca e apreensão, nesse contexto, é um incentivo ao inadimplemento das últimas parcelas contratuais”. Convém lembrar que na realidade brasileira – em que o desemprego atinge mais de 13 milhões de pessoas, em números de 2017- a imensa maioria dos cidadãos não deixa de pagar certas parcelas das dívidas por dolo, mas, ao contrário, por absoluta falta de capacidade financeira para fazê-lo.

2 visualizações0 comentário
bottom of page